Desenvolvimento Infantil
Conceituar o que vem a ser desenvolvimento infantil não é tão simples, variando com o referencial teórico que se queira adotar e os aspectos que se queira abordar. Para o pediatra, o “desenvolvimento é o aumento da capacidade do indivíduo na realização de funções cada vez mais complexas”; já o neuropediatra certamente pensará em desenvolvimento como a maturação do sistema nervoso central; o psicólogo, dependendo da formação e experiência, estará pensando nos aspectos cognitivos, na inteligência, adaptação, inter-relação com o meio ambiente; o psicanalista dará mais ênfase às relações com os outros e à constituição do psiquismo; enquanto que o fonoaudiólogo atentará para as habilidades lingüísticas, de fala e da comunicação social.
Mussen define o desenvolvimento como uma série de mudanças nas estruturas físicas e neurológicas, cognitivas e comportamentais, que emergem de maneira ordenada e são relativamente duradouras. Este processo – o como e por que o organismo humano cresce e muda durante a vida – é norteado por mudanças que parecem ser universais, não importando a cultura ou as experiências pelas quais as crianças tenham passado. Entretanto, é necessário observar que existem as diferenças individuais, e ainda compreender que o comportamento das crianças é influenciado pelo contexto ou situação ambiental.
Resumindo, desenvolvimento infantil é um processo que vai desde a concepção, envolvendo vários aspectos, indo desde o crescimento físico, passando pela maturação neurológica, comportamental, cognitiva, lingüística, social e afetiva da criança. Tem como produto tornar a criança competente para responder as suas necessidades e às do seu meio, considerando seu contexto de vida.
Incidência de alterações no desenvolvimento infantil
Não existem estudos estatísticos confiáveis que retratem a real incidência de crianças com problemas de desenvolvimento, tendo-se em vista a complexidade na definição e uniformidade no conceito do que seja desenvolvimento normal.
A Organização Mundial de Saúde - OMS estima que 10% da população de qualquer país é constituída por pessoas com algum tipo de necessidade especial, assim, cerca 34% a 37% das crianças apresentam algum risco para os problemas que acometem o desenvolvimento infantil.
Fatores de risco para problemas no desenvolvimento infantil
Diversos fatores podem ser responsáveis pelos problemas de desenvolvimento nas crianças. Na maioria das vezes não se pode estabelecer uma única causa, existindo uma associação de diversas etiologias possivelmente associadas ao problema.
Sendo o desenvolvimento da criança decorrente de uma interação entre as características biológicas e as experiências oferecidas pelo meio ambiente, os fatores adversos advindos destas duas áreas podem sim alterar o seu ritmo normal, surgindo então o chamado: risco para o desenvolvimento.
Constituem-se risco para desenvolvimento todas as alterações orgânicas \ biológicas quanto as ambientais \ emocionais.
Entre os riscos biológicos \ orgânicos encontramos os eventos pré, peri e pós-natais (antes, durante e após o parto), sejam de origem genética, ou não. Como exemplo de riscos biológicos encontramos: erros inatos do metabolismo, malformações congênitas, síndromes - por exemplo Down, prematuridade, hipóxia cerebral grave, kernicterus (icterícia grave), meningites e encefalites, dentre outras.
Entre os fatores ambientais \ emocionais estão as experiências adversas de vida ligadas à família, principalmente com a mãe ou cuidador, condições precárias de saúde, falta de recursos sociais e educacionais, reduzida instrução materna, estressores intra familiares - violência, abuso, maus-tratos e problemas de saúde mental na família, práticas inadequadas de cuidado e educação, dentre outros.
Apresentação clínica das alterações do desenvolvimento infantil
Os problemas no desenvolvimento na criança podem se apresentar de diversas maneiras, como alterações no desenvolvimento motor, na linguagem, na interação pessoal-social, no cognitivo, etc. Na maioria das vezes há comprometimentos que afetam mais de uma função e a criança apresenta alterações funcionais mistas em seu desenvolvimento.
Assim, a criança com paralisia cerebral, apresenta prioritariamente alterações no desenvolvimento motor, podendo também apresentar alterações no desenvolvimento da linguagem e na cognição. A criança com hipotiroidismo congênito não tratado também apresenta alterações no desenvolvimento motor, de linguagem e cognitivo. As crianças com surdez apresentarão prioritariamente alterações de linguagem, mas não raramente, outras alterações estarão associadas. A criança autista, em sua maioria, apresentam problemas na interação social, percepção e linguagem. Enfim, as apresentações clínicas apresentadas pelas crianças com problemas no desenvolvimento irão variar muito, não só no tipo de atraso como também na intensidade do mesmo.
Diagnóstico das alterações no desenvolvimento infantil
O desenvolvimento, ao contrário do crescimento, pode ser difícil de medir ou avaliar. Sua definição como: “O processo de mudanças mediante o qual a criança alcança maior complexidade em seus movimentos, pensamentos, emoções e relações com os outros.”, expressa esta dificuldade. Apesar disto é possível estabelecer certos padrões e áreas do desenvolvimento a avaliar.
De um modo geral há um consenso na literatura de que os pais são bons observadores e detectores acurados das dificuldades apresentadas por seus filhos, mostrando uma alta sensibilidade, especificidade e valor preditivo de suas opiniões na detecção dos problemas do desenvolvimento. Isso quer dizer que a ciência já comprovou o que todo mundo já sabia, “coração de mãe & pai sempre sabem”, assim, se os pais têm qualquer dúvida em relação ao desenvolvimento de se filho devem procurar o pediatra de seu filho e expor todas as suas questões, de forma clara e honesta, sem medo ou vergonha. Lembre-se: O quanto antes seu filho for atendido, mais probabilidade ele terá de se adequar ao que é esperado para ele.
É fundamental expor também que, as alterações do desenvolvimento motor são mais facilmente identificáveis do que alterações de linguagem e cognitivas. Já os distúrbios de linguagem, a hiperatividade e os transtornos emocionais não são comumente diagnosticados antes dos três ou quatro anos. Da mesma forma, distúrbios de aprendizagem raramente são identificados antes do ingresso da criança na escola – por volta dos 5 ou 6 anos.
Relembrando, para que a criança atinja todo seu potencial de desenvolvimento é necessário estar atento à sua evolução normal e aos fatores que possam intervir nesta evolução. Portanto, é necessário o acompanhamento não só pelos familiares, como também é necessário o envolvimento das informações dos profissionais de saúde (neuropediatra, geneticista, fonoaudiólogo, terapeuta ocupacional, fisioterapeuta...) e professores, para que se identifique as alterações, e seja realizado o encaminhamento da criança o mais precocemente possível para o tratamento.
Tratamento das alterações do desenvolvimento infantil
O tratamento das crianças com atraso no desenvolvimento vai depender muito do que está causando o problema. Se a criança apresenta um atraso devido a problemas ambientais, como falta de estímulo por parte de quem cuida da mesma, o tratamento consistirá em orientações aos pais sobre a importância da relação entre o seu desenvolvimento e a maneira como lidam com a criança. Muitas vezes é necessário tratar a mãe depressiva, que não consegue interagir com sua criança.
Se há uma patologia provocando o atraso, como a toxoplasmose e o hipotiroidismo congênito, é necessário tratá-las com medicamentos o mais breve possível, além do tratamento funcional com equipe multiprofissional – pediatra, neurologista, psicólogo, fisioterapeuta, terapeuta ocupacional, fonoaudiólogo, etc.
Se o atraso é seqüela de algo já acontecido, como a anóxia neonatal, o kernicterus (icterícia grave) ou uma infecção do sistema nervoso central, o tratamento consistirá em tratar funcionalmente as alterações presentes.
ATENÇÃO:
Nunca se deve esperar o esclarecimento etiológico (o motivo, a cusa) de um atraso no desenvolvimento para se iniciar um tratamento funcional (reabilitação) pois, muitas vezes, dependendo dos recursos disponíveis, leva-se muito tempo ou não se consegue chegar a uma etiologia.
São inúmeras as experiências demonstrando que a estimulação nos três primeiros anos de vida, para crianças com atraso no desenvolvimento já estabelecidos ou aquelas com risco de atraso, melhora sua performance, devendo, portanto, ser incentivado o seu início o mais cedo possível.
Este texto é parte da releitura - por Fga. Ana Leonor Torrano do
MANUAL PARA VIGILÂNCIA DO DESENVOLVIMENTO INFANTIL NO CONTEXTO DA AIDPI
AIDPI - Atenção Integrada às Doenças Prevalentes na Infância
OPAS – Organização Panamericana de Saúde